domingo, 13 de setembro de 2009

OVERDOSE

Muita música pra pouco ouvido
Muito ator pra pouca cena
Muito livro pra pouca leitura
Muito filme pra pouco cinema

Muita mão pra pouca obra
Muita genitália pra pouco sexo
Muito modelo pra pouca foto
Muita rima pra pouco verso

Muito partido pra pouco governo
Muito veículo pra pouca via
Muito santo pra pouco milagre
Muito sorriso pra pouca alegria

Muito diploma pra pouco ensino
Muita jura pra pouco amor
Muita ambição pra pouco talento
Muita batata pra pouco vencedor

Muito dever pra pouco direito
Muito dano pra pouca moral
Muita massa pra pouco brioche
Muita fantasia pra pouco carnaval

Muito prédio pra pouco terreno
Muito repórter pra pouca notícia
Muito remédio pra pouca doença
Muita opinião pra pouca sapiência

Muito palhaço pra pouca piada
Muito sonho pra pouca realidade
Muita conversa pra pouco assunto
Muito baú pra pouca felicidade

Todo mundo quer, todo mundo pode
Todo mundo sabe, todo mundo se sacode
O dia nasce e logo anoitece
Todo mundo diz que faz, mas na verdade nada acontece

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

QUE LUZ É ESSA?



O gênesis e o século XXI. Deus e o diabo. O homem e a mosca. Cristo e Judas. As donas de casa e os donos do mundo. Hemingway e Paulo Coelho. O trem e o disco voador. Bob Dylan e a turma de Jackson do Pandeiro. A maçã e o caroço da manga. Ali Babá e Al Capone. Marlon Brandon e o jornaleiro da esquina. Bob Dylan e Sergio Sampaio. Amazônia e Babilônia. O ouro de tolo e a água viva. John Lennon e Carlos Gardel. A boca cheia de dentes e a dentadura postiça. Thor e Yemanjá. O metrô e o carro a álcool. Freud e Alester Crowley. Salvador e New York. O colírio e os óculos escuros.
Está tudo no baú do Raul.
Raul Rock Seixas. O cachorro urubu. Estrela no abismo do espaço. O rock com cara de bandido. Elvis Presley com Luiz Gonzaga. Tropicalismo e rockzinho antigo. Art pop. Rock n´Raul.
O inimigo do “monstro sist” que nasceu há dez mil anos;
O dito cidadão respeitado que ultrapassou a barreira do som;
O moleque maravilhoso que alcançou a velocidade da luz;
O maluco que vinte anos após sua morte veloz continua vivo.
Vivendo nos seus filhos, na erva e na palavra rude que disse para quem não gostava.
Vivendo nas Nuits de lua cheia e bonita;
Nos segredos das luzes do arrebol;
Nos sonhos malucos dos sonhadores;
No calendário esquecido no bolso da camisa;
Nas profecias de que o mundo se acabará um dia;
Nos recados dados pelo muro;
Nas canções que o rádio não toca;
Nos girassóis que mostram a cara;
Na chuva que traz coisas do ar;
No café que se toma pra fumar;
No amor de todos os mortais;
Na voz que gira bailando no ar;
Na lei dos que fazem o que querem;
No oposto do que se disse antes;
Na sombra sonora do disco voador.
E, quiçá, viverá mais dez mil anos.
Raulzito e Raul Seixas, o mesmo homem.
Toca Raul!
O início, o fim e o meio.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

15 ANOS DE LAMA E CAOS



“Se queres ser universal começa por pintar a tua aldeia”
Tolstói


"Eu vou fazer uma embolada,um samba,rock maracatu, tudo bem envenenado,bom pra mim e bom pra tu,pra gente sair da lama e enfrentar os urubus"
Chico Science

"Computadores avançam, artistas pegam carona"
Fred Zero Quatro






A 15 anos, dos mangues do Recife, emergia “Da lama ao caos”.

O primeiro disco (uso este termo com tranqüilidade, pois ele acaba de ser lançado em vinil) de Chico Science e a Nação Zumbi. O marco zero do movimento manguebit (ou seria manguebeat?). O passo adiante que a cultura brasileira não dava desde a Lira Paulistana. A virada de mesa que faltava para revitalizar a nossa música popular. O complemento da evolução musical iniciada pela Tropicália. A afrociberdelia que desencadearia uma revolução na MPB.

Produzido pelo ex-“Mutantes” Liminha, um mestre em fazer tudo soar bem aos ouvidos, “Da lama ao caos” trazia Recife (A cidade, Manguetown) com seus rios, suas pontes, seus computadores, suas praias, suas antenas, seus urubus, suas vitrolas, seu banditismo, sua fedentina, seu caos, como conceito ao mesmo tempo em que, a partir dessa realidade, desnudava o país inteiro aos ouvidos do mundo.

Misturando - as tão rechaçadas quanto banalizadas - guitarras elétricas com tambores e influências musicais que iam de Manu Dibango a Jackson do Pandeiro, a banda apresentava uma sonoridade que misturava maracatu, rap, rock, embolada, tropicalismo, ciranda, afrobeat, psicodelia, funk, cordel, samba, capoeira e música eletrônica. As letras remetiam a Josué de Castro, Euclides da Cunha, Baudelaire, Jorge Mautner, Malcom X, Osvald de Andrade, revolta praieira, realismo fantástico, Tolstói,Cinema Novo,João Cabral de Melo Neto, ficção científica, Palmares,cibernética e socialismo latino-americano e mostravam as vísceras de uma cidade que através de um modelo equivocado de progresso chegou ao ponto de ser considerada a quarta pior cidade do mundo e retratavam as angustias e conflitos de uma juventude que vivia entre a fome e a evolução tecnológica, a abundancia e a miséria, a crendice e a ciência, a democracia e a escravidão, a lama (criação) e o caos (destruição).

A partir de então, os mangueboys tomaram conta de cena e o pop brasileiro se despiu de qualquer tipo de rótulo. Estava aberto o caminho para uma geração abandonada e que passava a vislumbrar na música popular uma saída para libertar sua imaginação do domínio exterior. O hip hop caminhava de mãos dadas com a embolada, o côco era dub e o maracatu com um tiro certeiro se infiltrava no rock n´roll. Os “carangueijos com cérebro” não só desentupiram as artérias, se não as sociais pelo menos as culturais, do Recife como fizeram jorrar um surto criação musical por todo o país. De Seu Jorge ao Cordel do Fogo Encantado, de O Rappa a Curumin, tudo que foi feito na música brasileira desde então passou seus ouvidos em “Da lama ao caos”.


Lançado pela poderosa Sony Music, o álbum foi eleito pelo editor musical do "The New York Times" um dos dez melhores álbuns de 1994, incluiu pelo menos quatro de suas músicas na galeria dos clássicos da música brasileira, encantou as Américas e a Europa, inseriu o festival recifense “Abril pro rock” no circuito mundial dos grandes festivais de música, abriu caminho para um punhado de bandas de qualidades oriundas do Recife, uniu o Nordeste ao Sul, mudou a cara da música popular brasileira e anunciou que nem só de pagodeiros, bundas e malhação seria feita a juventude dos anos 90. Enfim, modernizou o passado e salvou a música brasileira. Cumpriu sua missão.

Poucos meses depois, era lançado pelo selo Banguelas (dos Titãs) e produzido por Charles Galvin, “Samba esquema noise”, o primeiro disco do Mundo Livre S/A, primo de “Da lama ao Caos” e filho temporão de “Samba esquema novo” (Jorge Ben), que firmaria o manguebit como um movimento de extrema importância no cenário pop brasileiro.

Não é exagero dizer que depois daquele abril de 1994, a música brasileira nunca mais foi a mesma.

Se bem que o caótico Brasil continua naufragando no mesmo mar de lama.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

DUAS CARAS


Michael Jackson está morto.

Não o artista. O rei do pop. O Fred Astaire dos anos 80. O renovador do rhythm and blues. O moonwalker. O invencível.
Esse viverá para sempre. Estará sempre entre nós em videoclips, CDs, DVDs, discos de vinil, VHS, MP3, ou seja lá o que mais que os mercadores da arte cismarem de vender.

Morreu o homem.

O pai de três filhos.

Aquele que nós desconhecemos.

O ser-humano atrás da personagem.

A criança explorada e humilhada (molestada?) pelo pai.

O adulto acusado de molestar sexualmente menores de idade. Perversão? Oportunismo das outras partes? (Eu particularmente sempre acreditei na sua inocência. Assim como acredito na de Mike Tyson).

Black or white? Doença de pele? Vaidade? Criador perdendo-se na criatura?

O empresário inescrupuloso capaz de passar a perna no amigo (até então) Paul McCartney e faturar com a compra dos direitos autorais dos The Beatles.

A criança desgovernada que não conseguiu controlar seus gastos e faliu um patrimônio de bilhões.

O homem que se isolou na sua solidão. A criança que criou seu próprio mundo. Neverland.

Vítima de um mundo doente onde a mais valia está sempre em primeiro plano ou o seu maior ícone, a sua imagem e semelhança?

Heal the world. We are the world.

O que fica é a tristeza por saber que, mais uma vez, um talento ímpar, um homem genial em sua arte, foi evidentemente infeliz.

Que ele descanse em paz...

terça-feira, 5 de maio de 2009

INTERESSE


E lá se foi Augusto Boal...
Na grande mídia, pouco se falou.
Boal não interessa.
A mão invisível, que comanda o mundo e decide o que o povo irá pensar, comer, vestir, acreditar e produzir, decidiu que Boal é um assunto que não interessa.
Bastam poucas linhas. Um breve resumo. Sem muitas informações.
Nada de contar Zumbi, Tiradentes e Bolívar.
Boal era a força. A força que traz a liberdade.
Opinião. Arena. O espetáculo da vida diária.
Basta informar que foi preso e torturado.
Nada de declarações de fãs famosos. Muito menos apresentadores com cara de choro.
Teatro não deve interessar ao povo. Muito menos o do oprimido. Nada de experimentalismos. Nem coringas. Nem Paulo Freire. Nem Brecht. Nem legislativo.
O que interessa é a gripe, a violência das ruas, o aquecimento, o terror.
A vida vazia das celebridades fabricadas.
O que interessa é a idéia de que nada mais pode ser feito.
A vida deve ser uma rotina previsível como a programação recorrente dos canais de TV.
O filho do padeiro queria reação. A ação que faz parar a engrenagem. reação popular. A criação coletiva. A verdade escondida. Luzes no palco da vida diária.
Seu teatro trazia a chave para nos libertar de qualquer vírus. De qualquer guerra.
Da imprensa e de seus anunciantes.
Dos anunciantes...
Definitivamente, ele não interessa.

domingo, 26 de abril de 2009

APOIO AO MINISTRO



Gilmar não perdeu tempo.


Após o ministro Joaquim Barbosa lhe dizer ao vivo e via-satélite que ele está destruindo a imagem do judiciário e lhe recomendar sair às ruas para saber o que pensa a população, o “Supremo-Presidente” se reuniu a portas fechadas com os outros ministros que além de enviarem uma carta de apoio a Mendes ainda ensaiaram uma de repúdio a Barbosa.
Agora querem que ele se retrate.


É isso mesmo!


Quem começou as agressões foi Gilmar. Quem disse o que o povo pensa foi Barbosa. E Barbosa é que terá de retratar-se.


Quem concorda com o ministro Barbosa e pensa que Gilmar está realmente destruindo a imagem do judiciário e deve sair às ruas para saber a opinião do povo sobre ele, assine o movimento de apoio ao ministro Barbosa:

http://www.ipetitions.com/petition/credibilidade_judiciario/?e

Já que a democracia existe apenas em dois dos três poderes, está mais do que na hora de expressarmos nossa opinião.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

A VOZ DO POVO

Não foi no Congresso. Foi no Supremo.
No Supremo Tribunal Federal. A mais alta corte do nosso país.
Foi lá que um Joaquim, não o mártir (também mineiro), mas o Joaquim ministro, magistrado, poliglota,
Foi lá que o Ministro Joaquim falou com a boca do povo
E disse para o Gilmar Mendes, o todo poderoso Presidente do Supremo,
O ministro que teve o maior número de votos contrários à sua nomeação,
O homem que Dalmo Dallari disse não possuir os requisitos básicos para integrar a mais alta corte do país,
O juiz que libertou o banqueiro Daniel Dantas (duas vezes!), mais Celso Pitta, mais Naji Nahas,
Que ele está destruindo a imagem da justiça no nosso país.
E disse mais:
Disse que Gilmar -o magistrado que a pretexto do nosso país viver um estado policial, tentou transforma -lo num estado judiciário - está acabando com a (pouca) credibilidade do nosso poder judiciário.
Disse ainda, disse não, apenas deu a entender, que o que está na mídia não é o que está nas ruas.
A mídia não gostou. Para eles, isso não é comportamento digno de ministros do Supremo - a corte que nunca condenou um político.
Agora já falam até em crise.
Crise tá na moda.
A mídia é a moda.
Então, dá-lhe crise no Supremo.
Os ministros do Supremo também não gostaram.
Mas o povo gostou.
Finalmente, alguém falou o que o povo pensa.
Joaquim. O que possui elevação.
O primeiro ministro do Supremo a abrir processo contra um parlamentar.
O ministro que defendeu a acusação contra os quarenta mensaleiros.
O homem que se insurgiu contra o poder estabelecido.
E ensinou que a lei é igual pra todos.
Palmas para Joaquim Barbosa.
O cara.

sexta-feira, 27 de março de 2009

CHUMBO GROSSO



Em 1969, portanto há 40 anos, era lançado o primeiro disco de uma das bandas mais pesadas (no bom sentido) e criativas da história do rock ‘roll. Estamos falando, é claro, do Led Zeppelin.

O primeiro disco do Led Zeppelin mudou para sempre a história do rock. Com os vôos vocais de Robert Plant, a criatividade da guitarra de Jimmy Page e o peso da cozinha de John Paul Jones e John “Bonzo” Bonhan, o “Zeppelin de chumbo” não deixou pedra sobre pedra nos terrenos sobrevoados. Depois deles, tudo ganhou mais peso, nada mais foi tão suave.

Em 1969, depois dos experimentos de Zappa e das distorções de Hendrix terem aberto as cabeças para caminhos até então inimagináveis, já não era novidade que o rock estava partindo para uma sonoridade mais pesada, porém o primeiro disco do Zeppelin era uma radicalização da idéia. Da foto da capa ao último acorde de “How many more times”, a banda inglesa subverteu valores e escancarou a porta para o que viria a ser o heavy metal.

Gravado e mixado em apenas 36 horas, o Lp deflagrava uma verdadeira revolução dentro do revolucionário rock n’roll. Estava tudo ali. O passado, o presente e o futuro. O blues (You shook me), a psicodelia ( Baby, I’m gonna leave you) e o heavy metal (Comunication Breakdown). A música folklórica inglesa (Black moutain side) e o rock n´roll (Good times bad times) . Ou tudo junto (Dazed and confused). Todas as misturas, pensadas e impensadas, voaram nesse zeppelin.

O Lp bateu recordes de vendas chegando a integrar o top 10 da Billboard. A banda, que teve sua origem na idéia do ex-Yarbirds Jimmy Page de montar uma superbanda com os The Who’s Keith Moon e John Entwistle e o também ex-Yarbirds Jeff Beck, mostrou-se tão eficiente quanto seria a primeira idéia ou até mais. No mesmo ano ainda viriam a lançar outro lp: o também magnífico Led Zeppelin II e marcariam para sempre o seu lugar no altar dos deuses do rock n´roll.

Se no primeiro o peso era a novidade, no segundo a banda consolidaria seu estilo com músicas que ficariam para sempre no inconsciente de todo roqueiro que se preze (Wholla lotta love; Heartbreaker), baladas capazes de enternecer o mais duro dos corações ( Thank you; What’s what should never be) e um solo de bateria em grande estilo (Moby Dick), tudo isso e mais um pouco em um Lp concebido em menos de seis meses.

Por essas e outras, falar de Led Zeppelin é lembrar de um tempo que o rock n’roll não era apenas um negócio de empresários ávidos por lucros e garotos ávidos por fama, era, sobretudo ousadia, superação, criação e transpiração. É falar de uma época que músicas faziam parte de uma coisa chamada álbum que era concebido a partir de uma outra coisa chamada conceito e que muitas vezes resultava em uma outra coisa chamada arte.

O zeppelin de chumbo voou para o estrelato tendo como combustível muito sexo, drogas e rock n’roll. Depois de experiências com magia, batalhas judiciais com a família de Ferdinand Von Zeppelin, apresentações alucinadas com mais de três horas de duração e escândalos a respeito do envolvimento dos integrantes em orgias com fãs, a banda acabou em 1980 com a morte do baterista “Bonzo” Bonhan, sufocado no próprio vômito após beber o equivalente a quarenta doses de vodka. Estiveram pelo nosso céu por pouco mais de dez anos (o suficiente para influenciar o som das gerações que o sucederam, influencia essa claramente perceptível em bandas que vão de Aerosmith a Pearl Jam, de Guns N’Roses a Korn) e até hoje, vinte e nove anos depois de seu fim, deixam saudades nos corações daqueles que se deixaram seduzir por suas viagens cheias de peso e melodia.

Parabéns Led Zeppelin. Parabéns ao hard rock.

“It’s been a long time since I rock n’rolled...”

quarta-feira, 18 de março de 2009

LEILÃO


Vendem-se os óculos de Gandhi.
Compra-se água de Theri. Da Suez,
Água do Ganges. Brahma chopp.
Marcha do sal. Pré-sal. (Vendido!)

Vende-se o relógio de Gandhi.
Big Ben. Big Bang.
Caminho das Índias. Quit Índia.
Independência ou morte.

Compra-se amor.
Paz e amor. Guerra e paz.
Yoga sutra. Kama sutra.
Give peace a chance (Vendido!).

Compra-se a independência.
Jejum de lucros. Call centers. Tata.
Quem quer ser um milionário?
The Oscar goes to Gandhi.

Vende-se a sandália do Mahatma
Filhos de Gandhi. Cordão de isolamento.
Sistema de castas. Apartheid.
Camiseta de Che Guevara. (Vendido!)

Compram-se os óculos de Gandhi.
O lance mínimo é de $20.000.
Satiagraha. BRIC. Bomba atômica.
A liberdade de lucros e os lucros da liberdade.

A liberdade...

terça-feira, 10 de março de 2009

NEGÓCIO

A juventude da Baixada Santista é refém das univer$idades particulares e suas mensalidades.

Nos EUA, o país símbolo do capitalismo e do liberalismo, o número de universitários em universidades privadas é de 31%, na França, 11% e no Brasil, 80%. Na Baixada Santista, mais de 90%.

O velho papo de que para suprir as necessidades da região não há necessidade de abrir universidades públicas (principal argumento contra tal projeto) é furado.

MENTIRA.

Fosse verdade e as inúmeras universidades particulares da região não estariam se expandindo e enriquecendo cada vez mais.

Fosse verdade e o diploma universitário não seria praticamente requisito básico na maior parte dos empregos (Como é possível uma coisa dessas em um país com quarenta milhões de analfabetos?).

Fosse verdade e pagar mensalidades de faculdade não seria um peso para as famílias da maioria dos universitários da região.

Fosse verdade e o número de alunos que abandonam seus cursos por falta de condições de arcar com as mensalidades seria bem menor do que o que vemos.

Fosse verdade e o número de desempregados na região devido a tal falta de capacitação seria bem abaixo do apresentado.

Universidade para todos é universidade pública. O governo não cumpre sua responsabilidade com o ensino superior criando cotas para isso e aquilo nem financiando (com juros) cursos em centros universitários particulares para alguns jovens de baixa renda.

Afinal, todos nós sabemos que Universidades públicas não são só vagas, são também pesquisas, qualidade de ensino, estabilidade do professor e outros itens que nós sabemos que a grande maioria dos centros universitários não oferece.


“Educação não é negócio”, gritavam os clientes da UNI$ANTOS na porta da reitoria, indignados com os preços da mensalidade cobrados pela universidade católica. Enganaram-se. É negócio sim; e muito rentável. O setor privado de ensino chegou a movimentar o equivalente aos setores de petróleo, telecomunicações e eletricidade juntos. Prova disso é o ramo da educação no Brasil ter atraído a atenção de investidores estrangeiros com o assunto muitas vezes sendo tratado em cadernos de economia (!).


O problema da educação, quando falo de educação refiro-me à educação acadêmica, só será resolvido com a construção de escolas e universidades públicas.

O problema da educação só será resolvido quando formarmos mais professores que jogadores de futebol.

O problema da educação só será resolvido quando o congresso representar o objetivo de se construir uma nação ao invés das centenas de interesses particulares que lhe servem de motor.

O problema da educação só será resolvido quando tivermos um Estado comprometido com o cidadão e não com os empresários que financiam suas campanhas.

Onde estão os nossos deputados?

Depois que a deputada Mariângela Duarte conseguiu - apesar do veto do então governador Mario Covas e do voto contrário da bancada do PSDB - trazer a UNIFESP para a cidade de Santos (com cursos e vagas insuficientes para a região metropolitana) quase não se tocou mais no assunto como se ele estivesse resolvido.

Não está. Deputado não é eleito para ser cabo eleitoral. É eleito para lutar para que as necessidades da região sejam supridas.

O que tem mais força na câmara mais cara do mundo? A vontade do povo ou os interesses das faculdades particulares?

Quem elege os deputados? A população formada em sua maioria por pessoas sem condições de cursar instituições privadas ou os mercadores do ensino?

Uma região não progride com arranha-céus, shopping centers, tv digital ou túneis; o que traz o verdadeiro progresso é a formação de cidadãos e isso só é possível com ensino de qualidade* para todos. Gratuito.

Com a palavra (na câmara, não nos palanques) os nossos parlamentares.


* A qualidade do ensino superior no País já foi tratado anteriormente no texto “Tesouros da juventude ( http://mandandobrasa.blogspot.com/2007/07/tesouros-da-juventude.html )

sexta-feira, 6 de março de 2009

EXCOMUNHÃO

O arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, excomungou a equipe médica e os parentes da menina de nove anos que interrompeu uma gravidez de alto risco (afinal ela tem apenas nove anos!) resultante de violência sexual – a menina era estuprada pelo padastro desde os seis anos.

A menina escapou da excomunhão pelo fato de “a igreja ser muito benévola com pessoas menores de idade”, segundo o arcebispo que justificou a excomunhão alegando que as leis de deus estão acima das leis dos homens.

Ou seja, tendo como base o carnaval feito pela igreja, um feto pode contar mais com a proteção da lei divina que uma criança nascida há apenas nove anos. Ou a igreja não consegue perceber o risco que a continuação da gestação significava para a vida da criança?

E ainda tem mais: um advogado da Arquidiocese (meu deus, D.Hélder Câmara já ocupou essa mesma arquidiocese...) Márcio Miranda, apresentará denúncia contra a mãe da criança por ter autorizado o aborto.

Enfim: A instituição responsável pelas trevas da Idade Média, que impôs ao mundo quase setecentos anos de atraso e assassinatos com a sua “santa” inquisição e colaborou (se não, no mínimo se omitiu) com o extermínio dos nativos do continente americano e com a escravidão dos negros africanos continua se posicionando segundo seus dogmas e interesses.

Não é a toa que a cada ano que passa mais pessoas se afastam de suas amarras...

Uma pergunta não quer calar: Por que o arcebispo não excomungou o estuprador? Será que na visão da igreja o estupro não atenta contra as leis de deus?

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

AH, ARACY!


Em 2009 comemoramos os 75 anos do disco “Em plena folia”, o primeiro disco da cantora Aracy de Almeida. Aracy de Almeida.

Araca. A dama do Encantado. Rainha dos parangolés. Arquiduquesa. O samba em pessoa. Alegre, contente, cigana, terrível. Ela era o samba.

Aracy é coisa nossa. Cantora por excelência: ainda criança cantava hinos religiosos em igrejas batistas e, escondida dos pais, entoava pontos de candomblé nos terreiros. Em 33, “farta de cantar de graça”, foi descoberta por Custódio Mesquita que a levou para a rádio Educadora. Gravou “Em plena folia” em 34 (acompanhada por Pixinguinha e sua orquestra) e conheceu o sucesso em 35, com o samba “Palpite infeliz” de Noel Rosa, com quem se apresentava, “em casas suspeitas, no Mangue, no baixo meretrício”.

Considerada pelo poeta da Vila como a cantora que melhor interpretava suas composições, Araca viveu durante anos o estigma (um dos tantos que a perseguiam) de “intérprete de Noel”. Afinal, grande parte dos seus clássicos tornou-se sucesso na voz dela (Último desejo, Meu barracão, Três apitos, Cansei de pedir, só para citar algumas) que foi a responsável pelo resgate da memória do amigo - esquecido após sua morte precoce - gravando os antológicos Lps lançados pela Continental (da primeira leva de lançamento de Lps no Brasil): Aracy canta Noel, com capa de Di Cavalcanti, arranjos de Radamés Gnattali e texto de Fernando Lobo (ta bom ou precisa mais?), o que levou a uma reavaliação da obra desse que hoje é considerado um dos maiores gênios da nossa música popular.

Mas nem só de Noel se fez o repertório dessa dama da música brasileira, fã de Ella Fitzgerald, Mozart e tango argentino, leitora de Freud e Schopenhauer, seu bom gosto a manteve próxima dos grandes compositores de sua geração. Sua voz anasalada coloriu obras de praticamente todos os grandes compositores da “época de ouro” e alguns de outras gerações. Gravou Ary Barroso (Camisa amarela), Custódio Mesquita (Saia do caminho), Assis Valente (Fez bobagem), Adoriran Barbosa - numa parceria inusitada com Vinícius de Moraes - (Bom dia, tristeza), Antonio Maria (Se eu morresse amanhã), Dorival Caymmi (Quem vem pra beira do mar), Paquito (Não me diga adeus), Wilson Batista (Louco), Caetano Veloso (A voz do morto – composta em sua homenagem), entre tantos outros, além de garantir ser dela o mote “Amélia é que era mulher de verdade” que serviu de inspiração para o clássico “Ai que saudades da Amélia” de Ataulfo Alves e Mário Lago.

Seu talento sobreviveu a modismos e mudanças. Fez shows com Carmem Miranda, Billy Blanco, Sérgio Porto, Paulinho da Viola, Jorge Ben(jor), Toquinho, além do histórico espetáculo (que virou Lp) “O samba pede passagem”, de 1965, em que dividiu o palco do teatro Opinião com Ismael Silva, MPB4, Baden Powell e o Grupo Mensagem (do qual faziam parte Sidney Muller e Luís Carlos Sá), com texto de Oduvaldo Vianna Filho e direção de João das Neves e Armando Costa. Em 1980, gravou o Lp “Ao vivo e à vontade” (lançado apenas em 1988, pouco depois de sua morte), no teatro Lira Paulistana (casa onde se apresentava a vanguarda musical de São Paulo nas décadas de 70 e 80). Com produção e texto de Zé Rodrix, é um dos discos mais espontâneos da discografia brasileira. Lá é possível ouvir seus “esporros” com a banda e a platéia, suas estórias sobre Noel e suas brincadeiras e erros, dando a nítida impressão – apesar dos poucos 34 minutos - que o show está inteiro ali, sem cortes.

Considerada por Mário de Andrade como a dona de uma voz quente e sensual e aclamada por Di Cavalcanti como a maior cantora do Brasil, a "arquiduquesa do Encantado" jamais se comportou como a majestade que era. Dona de um comportamento irreverente e transgressor demais para a época, não tinha papas na língua e falava o que lhe vinha à cabeça, além de frequentemente levantar as blusas e exibir os seios para os amigos estivesse onde estivesse, vestir-se com botas e calças cumpridas e discutir sobre existencialismo, futebol e artes plásticas ou citar a bíblia nas mesas dos bares cariocas até de amanhecer. Tudo isso muito antes da queima de sutiãs.

Por outro lado era uma mulher simples, cuja generosidade chegava a encabular os amigos, dedicada a criar cachorros e plantas, que preferia sua casa no Encantado aos luxuosos apartamentos da Zona Sul, tão cobiçados pelos famosos da época. Sair do Encantado é que era o X do problema.

Enjoada de cantar, e com o “mingau grosso demais”, abandonou a carreira, deu seu aval ao tropicalismo, parou de beber, amadrinhou a banda percussora do punk brasileiro Joelho de Porco (ela bem pode ser considerada a primeira punk do nosso país) e virou jurada nos programas de calouros de Chacrinha e Silvio Santos, imagem pela qual ficou conhecida pelas gerações mais jovens (hoje, nem tão jovens assim).

Numa época em que as cantoras preferidas do público são as que se preocupa mais com a malhação que com o canto, que a rebeldia é fabricada em escritórios de propaganda e que gostar de música significa entoar refrões que qualquer bebê balbuciante seja capaz de reproduzir, Aracy com sua afinação precisa, seu despojamento, sua divisão comovente, sua cadência absoluta, sua malandragem e seu repertório delicado e de alto nível não é exatamente o que se espera de uma grande cantora.

Talvez um dia o Brasil lhe faça justiça (tomara que nenhum outro país precise fazer primeiro) e a cantora de talento ímpar suplante a figura caricatural da jurada ranzinza e mal humorada.

Enquanto isso não acontece, vamos comemorar as bodas de brilhante da nossa música popular com a voz dessa mulher encantada que foi o samba em pessoa: Aracy de Almeida, a Billie Holiday brasileira.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

FAMÍLA DULIXO


Família Dulixo. Uma rapaziada da pesada que trabalha para transformar lixo em arte.
No blog do dulixo você encontra textos sobre a arte da periferia, eventos, além dos trabalhos realizados nas escolas junto as crianças, que hoje mais do que nunca, precisam compreender a importancia da arte na vida de todos nós.
Eu também estou nessa.
Acessem:

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

ABORTO

Renatinho abriu os olhos e se deparou com o teto verde da enfermaria. Aos poucos foi recobrando a consciência e entendendo onde estava e o porquê. Ouvia uma música de MV Bill tocando num rádio próximo e uma voz que cantarolava junto em voz alta, provavelmente de um soldado. As facadas que tomara na cela ainda doíam física e moralmente. O agressor, um tal de Mandarim, o pegara “na trairagem”, pelas costas. Motivo: o reconheceu de uma briga em um pagode e decidiu se vingar da surra que levou na ocasião.

Deitado na cama da enfermaria, Renatinho sentia um imenso ódio. E um pouco de dor. Mas, o ódio era mais visceral. Foi o ódio o sentimento que marcou sua vida. O único que o acompanhou em seus vinte e dois anos. Lembrava-se do primeiro contato com o sentimento aos doze anos de idade quando tio Marcelo o contou que ele só nascera devido a um aborto mal sucedido:

- Tua mãe sempre foi a cachorra que é hoje – contou-lhe o tio – quando ficou prenha não tinha nem certeza do pai. E se hoje ela é maluca, imagina com quatorze anos! Foi correndo tentar abortar o filho, você moleque, antes de tu nascer tua mãe já tentou te matar. Por isso que eu te falo, esquece essa filha da puta. Se tu deixar eu a tua vó que te criamos prá ir morar com a porra louca da tua mãe e aquele otário que ela arrumou vai se dar mal, vai por mim que eu sei o que eu tô falando...

Cada vez que se lembrava das palavras do tio, Renatinho sentia ódio, de sua mãe e dele mesmo. Ela não gostava dele porque ele não tinha morrido. Ele era o filho que ela teve antes de conhecer Jesus. Criança sem pai. Uma lembrança dos tempos de perdição. Seus irmãos tinham pai. Pai e mãe. Eram frutos da comunhão em Cristo. Ele não. Ele era filho do pecado, da vadiagem. Um estorvo pra sua mãe, pra Vó Rosita e pro Tio Marcelo. Ainda bem que seu filho não insistiu em nascer. Não passaria por nada daquilo. Não precisaria ver o mundo como que lhe fazendo um favor por o deixar existir. Não precisaria passar a vida inteira tentando mostrar para a avó que ele era tão bom quanto o tio e por isso merecia amor também. Seu filho obedeceu a sua vontade. Morreu antes de nascer, por isso não seria infeliz. Não precisaria ver os outros com tudo aquilo que ele nunca teria.

Não sentiria culpa por ser pobre, por não ter pai, por ser filho do pecado. Renatinho sorriu na cama da enfermaria. Matar o filho antes de nascer foi a maior prova de amor que ele pode lhe dar. Sua mãe o amava também. Ele que não soube ser amado e insistiu em nascer.

Escutou o barulho dos carros que passavam. Tio Marcelo comprou um carro bacana pouco antes de ser preso. Ele também tinha uma motinha. Todo mundo queria ter um carro ou uma moto.
“Esse País é paranóico por motor. Todo mundo quer ter um carro ou uma moto custe o que custar. Vai tomar no cú...”, dizia Leo, um rapaz estudado, com diploma e tudo!, que de vez em quando aparecia na área. Era amigo de Snoop, um cantor de rap da comunidade. Os dois apareciam no bar do Neco e ficavam cantando, falando de política, mulher ou jogando sinuca. O pessoal da área gostava de Leo porque apesar de ser estudado, de conhecer de um monte de assunto, ele se juntava com a galera e não fazia diferença. Não era igual os ”boy” que cantavam rap em Shopping Center e só falavam com eles quando queriam comprar droga. Se ele tivesse uma família completa com condição nunca que entraria pro crime. Ia era arrumar um emprego bacana, estudar igual ao Leo, fazer uma família. Se tivesse condições seu filho ia ter nascido. Não conseguia entender aqueles “boy”, cheios de oportunidade e levando a vida pelo errado. Ele não tinha outra opção. Mas eles tinham família, tinham conhecimento para arrumar um emprego. Ele não. Tentou estudar, mas Tio Marcelo não podia pagar uma escola bacana e aquela merda de escola do Estado era perda de tempo. Emprego bom, com estudo e sem conhecimento já era difícil. Sem estudo e sem conhecimento então, nem se fala.

O único jeito de ganhar dinheiro, dinheiro grande!, era no crime. Foi Tio Marcelo quem lhe ensinou a roubar toca fitas. “Vamô lá, moleque. Tá na hora de começar a ajudar nas despesas do barraco”, disse o tio no primeiro dia de roubo. Sentiu-se importante nesse dia. Agora ele não era mais um peso na família. Era bom como o tio Marcelo. Ia ganhar dinheiro e ter um carrão também. E Vó Rosita iria ter orgulho dele.

“Vida de merda!”, disse Renatinho deitado na cama fedida da enfermaria. A cama fedia. O quarto fedia. Ele fedia. Sua casa, sua rua, seu bairro, tudo ao seu redor sempre fedeu. Sentia ódio de quem não vivia ali. De quem tinha uma casa perfumada. Uma roupa perfumada. Daquela molecada cheirando a perfume que o olhava com medo. Medo de perder o que estava sobrando. Usavam cada dia um tênis pra ir pro colégio e quando ele, que não tinha nenhum, tomava um, era chamado de criminoso, bandido.

“Filhos da puta!”, pensava ele, “eu não tenho culpa de não ter uma família bacana pra me dar uma roupa...”. Por isso que seu filho não nasceu. Pra não se sentir um animal perigoso quando visse aquelas cocotinhas, cheirando a loja de Shopping, fugindo dele na rua ou o olhando como se ele fosse agredi-las. Pra não precisar fingir que não sentia o cheiro de comida quando passasse em frente aos restaurantes. Para não saber que aquelas Patricinhas que iam no baile funk só transavam com ele pra ganhar cocaína. Ele era um lixo. Começou a chorar na cama da enfermaria. Por que insistir em nascer? Pra ficar jogado ali naquela cama fedida e depois que se curar voltar pra uma cela podre, onde no calor não se aguentava o abafo e o bafio. Da cama podia ouvir o pensamento de quem passava na rua: “eles têm que apodrecer aí dentro pra aprender”. Aprender o que? A viver como animal? Isso ele já sabia desde que nasceu. Aprender a sentir ódio? A matar pra não morrer? Tudo isso ele sempre soube, não havia o que aprender lá dentro. Ele queria sim, aprender a amar. A sonhar. Mas isso ninguém estava disposto a lhe ensinar.

O rádio agora tocava uma música antiga dos Racionais MCs. Lembrava-se de ouvi-la na infância junto com tio Marcelo. “Mano Brown sobreviveu no Inferno através da arte, ele retrata o Brasil que sobrou pra gente, a parte que nos cabe nesse latifúndio...”, disse uma vez Snoop ao Leo numa daquelas conversas que só eles entendiam. “Esses caras já começaram a viajar!”, explicou tio Marcelo. “Sim ganhar dinheiro, ficar rico enfim / Quantos morreram assim, sonhando igual a mim?”, cantava Mano Brown no rádio distante. Ele era filho da perdição e aquele era o seu castigo. Ser o lixo dos bacanas. Ser a parte da sociedade que os políticos escondem quando tem visita internacional. Ser aquele que merece apodrecer. Só Leo não os condenava.

Renatinho sorriu lembrando de Leo. Ele achava que eles eram bons. Conseguia entende-los. Mas, se alguém lhe contasse que ele estava ali, esfaqueado, na cama de uma enfermaria da cadeia, ele talvez nem lembrasse de seu rosto. Poderia até dizer no meio do bar: O Zé Pequeno é legal - Leo de uns tempos pra cá passara a o chamar de Zé Pequeno sabe-se lá porquê; Mas, num País de merda, que nem é esse, acabam ficando excluídos até que acontece uma porra dessa... - e depois viraria para o lado e começaria a discutir outro assunto.

Mas, Leo era estudado, sabia das coisas e achava que ele era bom. Tio Marcelo também achava. Mas, também estava preso. Por que? Alguém poderia explicar por que o mesmo policial que usava drogas deles, os prendiam por eles venderem drogas? Nada fazia sentido. Estava tudo errado. Havia duas leis. A dos bacanas, que era a mesma da polícia. E a da comunidade. Mas como os bacanas e a polícia tinham o poder a lei deles é a que ficava sendo certa. Leo conhecia as duas e por isso sabia que eles eram bons. Quem estava certo, Léo que tinha estudado em colégio bacana, até na faculdade, e sabia de tudo ou Andrezinho que depois de passar pela mesma vida conheceu a palavra de Deus? Leo disse que Andrezinho também era enganado. No fundo ele também odiava Leo. O odiava porque ele só gostava deles quando estava ali cantando rap com o Snoop. Quando clareava, ele ia pra casa bacana dele curar a ressaca e eles continuavam ali naquela merda, sem nada mudar. E odiava Andrezinho porque agora ele se sentia superior a eles. O rádio começou a tocar uma música de Negra Li e ele ao ouvir a voz da cantora se lembrou de Lucilene.

A única pessoa que ele não odiava era Lucilene. Ela entendeu que o filho deles não poderia nascer e o matou. Ele se excitava toda vez que a via, seu corpo,seu cheiro. Sentia vontade de transar com ela o tempo todo. Aquilo que era amor. Ele a amava. Ela era boa. No dia das visitas estaria ali com ele, iria trazer drogas. Eles iriam cheirar muito e transar. Eles se amavam de verdade. Lucilene estava fazendo computação e curso de cabelereira; ela ia se dar bem. “Periferia resiste...”, cantava Negra Li.

Nilsinho do Beco entrou no quarto. Não podia ser. Nilsinho estava morto. Ele o matou. Mas, não na “trairagem”. Avisou. Levou uma idéia, deu chance dele fugir. Fez tudo pelo certo. Cumpriu a lei. Nilsinho não botou fé e ele teve de cumprir o prometido. Dois tiros. Só estava ali em cana, naquela enfermaria de merda, porque quem fazia a tal de constituição, que o Leo falava, era um bacana que não conhecia como funcionavam as leis na comunidade. Se a tal constituição fosse escrita por Tio Marcelo, ele estaria livre. E não teria de apodrecer. Seria um homem bom.
Nilsinho sorria prá ele. Riso de deboche.”Vai embora,filho da puta”, gritava desesperado,”vaza X9”. Mas, Nilsinho não saia. Ouviu uma outra voz dizendo que ele estava delirando. Não enxergava mais nada. Estava com dor, muita dor. Ele não merecia o Inferno. Não merecia aquela merda toda. Deus era mal. Injusto e mal. Deus era mentira, assim como era falsa a preocupação de Leo com eles. Assim como era falsa a palavra de Andrezinho. Assim como era mentiroso o tesão das Patricinhas funkeiras que transavam pra ganhar droga. Mas elas eram moças boas. Por que? Elas também matavam e fora da lei. Algumas matavam a própria família “Eu não queria nascer!”, gritou, como que pedindo desculpas a sua mãe.

Sentia alguém mexendo no seu corpo. Seria Nilsinho? Fora ali pra se vingar? Na trairagem? Seria o doutor? O doutor estudou, teve uma família bacana pra lhe arrumar um emprego, por isso era bom. “Não há mais tempo pra nada...”, cantou Mano Brown; “Periferia resiste...”, cantava Negra Li.

Onde estava Lucilene nessa hora? Ele também era bom. Quem dizia que ele era ruim, eram os bacanas que davam notícia na TV, os políticos e a polícia. Mas, os bacanas das notícias quando iam comprar droga diziam que, na TV, as notícias eram manipuladas pra satisfazer o interesse de quem bancava. Os políticos, Leo dizia que mentiam pra roubar o dinheiro da população. E a polícia matava fora da lei e roubava as drogas deles pra vender pros bacanas. Adormeceu com a certeza de que era bom.

Dois dias depois, Renatinho se entregou ao segundo aborto e dele não escapou. A sociedade que o expurgara e o deixara a margem por o considerar um estorvo finalmente estava livre dele.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

TRANSPORTE

A cidade de Santos continua em primeiro lugar no ranking das passagens de ônibus mais cara do país.

O aumento está em vigor desde o dia 31 de dezembro. Ou seja, no mesmo ano em que se elegeu com uma campanha que dizia que amenizaria o problema do caos viário da cidade incentivando as pessoas a usarem menos os automóveis oferecendo transporte público de qualidade, o prefeito Papa resolveu dar o primeiro incentivo: aumento de 10% no preço da tarifa. A qualidade continua a mesma (quem usa os ônibus de Santos sabe do que estou falando).

O aumento causou manifestações do Centro dos Estudantes de Santos que defende o passe livre e o bilhete único para toda a baixada.

Na capital do estado, uma cidade onde o passageiro circula muito mais nos veículos, a tarifa dos ônibus municipais (uma das mais caras do mundo!) continua R$ 2,30. Em Curitiba, cidade cujo sistema de transporte público é considerado o melhor do País, a população protestou (com razão!) o aumento de R$ 1,90 para R$ 2,20 – R$ 1,00 aos domingos. Isso para pegarmos exemplos só no nosso país, onde o sistema de transporte público está muito aquém das necessidades da população. Pergunto:

Qual o diferencial? O que há de espetacular na tão aclamada “moderna frota santista” que justifique ser a tarifa mais cara do país (se considerarmos o tamanho da nossa ilha e a quilometragem que cada veículo percorre)? Afinal de contas, se levarmos em consideração o tempo de espera nos pontos e o conforto nos veículos (em determinados dias e horários, superlotados) nosso sistema de transporte público está longe do satisfatório.

Quanto aos ônibus intermunicipais da região é melhor nem falarmos. Só o fato de não existir um bilhete único para toda a Baixada já é motivo para descredibilizar qualquer ladainha sobre região metropolitana.

A Tv Tribuna, que dedicou dois dias exibindo praticamente a mesma matéria com o claro intuito de convencer a população da cidade a não comprar as mercadorias dos ambulantes da praia ( apenas daqueles que não possuem o crachá da prefeitura, é bom que se diga), poderia elucidar seus telespectadores sobre o disparate que significa o preço das tarifas de ônibus na terra da caridade e a obrigação dos governos de garantir passe livre em transportes públicos.

A propósito, o parque municipal inaugurado no emissário submarino recebeu o nome de Roberto Mário Santini, diretor-presidente do Sistema A Tribuna de Comunicação, falecido em 2007. Uma amostra de afeto entre o governo e o maior grupo de comunicação da região; o que, cá pra nós, é fundamental para a nossa democracia.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

TRUPE DA TERRA

Aos leitores dos meus textos aqui no "Mandando Brasa", aviso que agora também assino uma coluna no site "Trupe da Terra", uma revista eletrônica no ar desde 2004 cujos colaboradores são baseados em Santos (alguns do extinto jornal "Cidade de Santos").
Para ver a minha coluna "Preto no branco" clique:
http://www.trupedaterra.com.br/colunas.aspx?colunista=40

Para ver o Trupe da Terra:
http://www.trupedaterra.com.br/default.aspx

sábado, 24 de janeiro de 2009

REFORMA. PRA QUE?

Desde o início do ano entrou em vigor uma nova reforma ortográfica, proposta desde 1990, e que visa uma integração de todos os países que falam o português.

Não poderíamos passar muito bem sem mais essa?

Afinal, tentar unificar a língua de um País – que devido a sua grandeza geográfica e as várias matizes de sua colonização às vezes parece que nem todos falam a mesma língua – com a de outros sete Países através de uma reforma ortográfica parece que é uma resolução que não leva em consideração o fato de que a língua (e suas mudanças) é algo que vem do povo, da cultura e dos costumes da população, e não algo que pode ser ditado de cima para baixo. Ou de fora para dentro.

Todos nós sabemos que nossas regras ortográficas e gramaticais são tão complexos que por vezes deixam em dúvida até mesmo professores e profissionais de letras. Então, qual o sentido de confundir ainda mais mudando as regras de fora para dentro?

Será que o (nosso) dinheiro que o governo gastará com a reforma (não vou explicar) não seria muito melhor usado em investimentos para que todos os habitantes do nosso País soubessem ao menos as regras básicas de fala e escrita?

Se os governos dos países de língua portuguesa querem unificar seus povos, não seria mais fácil começar no âmbito da cultura? Por que, ao invés de reformar a língua deixando a população ainda mais perdida quanto ao seu próprio idioma (e quando falo em população refiro-me a todos e não apenas aos jovens em idade escolar) não se cria um contato maior com as músicas e filmes de Portugal e Moçambique, por exemplo? Por que não facilitar para o nosso povo (e para o deles) um intercâmbio maior com esses países?

Os únicos que têm motivos de sobra para comemorarem são os donos de editoras e gráficas.

Nós continuaremos, ainda por muito tempo, escrevendo uma coisa e ouvindo nosso cérebro ditar outra.

Em suma, nessa jogada o povo mais uma vez foi preterido. Seria muito mais sadio para a nossa soberania se assumíssemos que possuímos uma língua própria, com todas as miscigenações e desvios que formaram a nossa identidade, e não a de nossos colonizadores. A unificação na prática não acontecerá, até porque a pronúncia das palavras não sofreu nenhuma alteração.

Pois como já dizia Noel Rosa: “ tudo aquilo que o malandro pronuncia com voz macia é brasileiro, já passou de português.”

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

CELSO E O BALANÇO DA DESINFORMAÇÃO

Ainda falando do caso Cesare Batistti e o serviço de manipulação e desinformação prestado pela imprensa brasileira e analisado no meu texto "Desinformação", o texto "Balanço final de uma pequena epopéia" do incansável Celso Lungaretti, que lutou com unhas e dentes pela não extradição de Battisti, faz um balanço do comportamento da nossa impren$a e suas verdadeiras intenções nesse caso:

http://naufrago-da-utopia.blogspot.com/2009/01/balano-final-de-uma-pequena-epopia.html

Boa leitura!

domingo, 18 de janeiro de 2009

DESINFORMAÇÃO

Baudelaire escreveu: “Não compreendo que uma mão pura possa tocar num jornal sem uma convulsão de asco.”.

Neste início de ano a grande imprena brasileira deu sinais de ser digna dessa convulsão de asco na cobertura de dois acontecimentos: os ataques de Israel em Gaza e a não extradição de Cesare Battisti.

Tudo bem que todos nós sabemos que imparcialidade na imprensa é praticamente um conto de fadas, uma utopia que habita os corações dos vestibulandos de comunicação e que cai por terra, junto com os cabelos, logo nos primeiros dias de aula, mas daí a apresentar sempre dois pesos e duas medidas é desprezar o poder de discernimento do receptor.

Vejamos o caso dos ataques: será que se a chamada ofensiva fosse feita pelo Irã, seria tratada apenas como uma ofensiva, uma resposta à ataques, uma tentativa de paz? Ou os âncoras, colunistas e correspondentes estariam a soltar bravatas sendo a palavra “terrorista” repetida duas vezes em cada frase? O quer faz dos ataques do Hamas a Israel terrorismo e os de Israel, simples ofensiva? Por que para a nossa grande mídia alguns países têm direito a matar quem quiser e outros só têm o dever de receber os ataques?

Mais escandaloso ainda é o caso de Cesare Batistti. Como se não bastasse a nossa impren$a (a mesma que no caso do gás boliviano defendeu com unhas e dentes a nossa soberania que, segundo o ponto de vista deles, estava sendo ameaçada) tomar partido do governo Berlusconi em detrimento da nossa constituição – que assegura que nenhum estrangeiro vítima de perseguição política será extraditado - ainda deram um show se omissão, covardia e deturpação dos fatos. Batistti foi tratado o tempo inteiro como “terrorista”, além de o fato de ele ter sido julgado à revelia por um tribunal de exceção, fato admitido até mesmo pelo ex-presidente da Itália, e, portanto senador vitalício Francesco Cossiga, não impediu que ele fosse tratado como assassino (justiça seja feita: a TV Globo mostrou a declaração de Cossiga em favor de Battisti). Quanto ao desrespeito italiano de pedir que o presidente Lula “passasse por cima” do ministro Tarso Genro e extraditasse o perseguido foi noticiada, no costumeiro tom subserviente, como uma atitude normal de um patrão que não tem sua ordem cumprida pelo subalterno.

Como se não bastasse toda a confusão de fatos e posições, alguns (tele)jornalões ainda foram resgatar o caso dos lutadores de box cubanos que queriam asilar-se no Brasil e, segundo a nossa imprensa, foram mandados de volta para as mãos do “sanguinário” governo cubano. Omitiram como já haviam omitido na época, que os lutadores voltaram para Cuba por livre e espontânea vontade, segundo relatório da Polícia Federal e entrevista de um deles ao Granma e que o Brasil concedeu asilo a outros atletas cubanos no mesmo Pan. Curioso é o seguinte: por que o governo errou ao mandar os cubanos de volta e errou de novo ao tomar atitude contrária com Battisti. Por que os cubanos deveriam ficar – mesmo contra a vontade – e o escritor italiano tem que ser mandado de volta? A Band, a mesma que julgou uma desumanidade os cubanos voltarem para Cuba, chegou a usar em seu editorial a palavra “covardia” para classificar a atitude do nosso governo. Não seria uma covardia muito maior se render aos interesses italianos, colocando-os acima, inclusive, da nossa constituição? Foi covarde também a França de Miterrand quando se negou a entregar o mesmo Battisti? Por que a França de Sarkozi negar a extradição de Marina Petrella, a pedido de Carla Bruni e sua irmã (ambas italianas, para os que querem colocar o fato como uma ofensa ao povo italiano) é um ato de humanismo e o governo Lula negar a extradição de Battisti (também doente) é uma covardia? Por que ao invés de condenar Battisti e apoiar o tribunal de exceção a nossa impren$a não trouxe de volta à cena a operação Gládio (apurada em 2000 em um inquérito parlamentar) promovida pelos serviços secretos norte-americanos que praticavam crimes contra civis, sob falsa bandeira, para culpar os comunistas e justificar os tribunais de exceção?

Como vemos a prioridade da nossa grande impren$a são seus próprios intere$$es, os de seus patrocinadores e daqueles que a alimentam politicamente, a última preocupação (se é que existe!) é a informação pública.

Público esse, que embora não saiba, é o verdadeiro dono da concessão.

Por essas e outras é que se faz urgente uma revisão no sistema de doação e renovação das concessões públicas dos meios de comunicação no Brasil.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

GENTILEZA

“Apagaram tudo, pintaram tudo de cinza, a palavra no muro ficou coberta de tinta...”

Saudades de Gentileza. Saudades da gentileza.

O início de um novo ano, com direito a arrastões, quebra-quebras, saques e espancamentos em pleno Dia Internacional da Paz (isso para não falarmos na carnificina de Gaza), é uma ótima oportunidade para trazermos a gentileza de volta para as ruas, lares e escritórios. Para as nossas vidas.

“Gentileza gera gentileza”, dizia o “profeta” que após o dramático incêndio do “Gran Circus Norte-Americano”, em Niterói (1961), deixou de ser José Datrino para se transformar em Gentileza. Convencido de que tinha uma grande missão no mundo, passou quase trinta anos pregando palavras de amor e solidariedade Nas rodoviárias, trens e praças do Rio de Janeiro, nas barcas Rio-Niterói e escrevendo palavras contra o sistema capitalista e de solidariedade nos muros da cidade. Com sua túnica branca e cabelos e barbas longas, definia-se como amansador dos burros homens da cidade.

Mas, infelizmente, o milagre que o Brasil queria não era o da gentileza. A sedução do “progresso de fachada” dos arranha-céus e rodovias, dos automóveis e eletrodomésticos, desviou a atenção da tropa das palavras gentis de “José Agradecido” e o milagre do progresso trouxe consigo a perda da ternura. Seduzido pelo poder do capital, raiz de toda a perversidade do mundo, segundo o profeta, o país caminhou em sentido oposto aos propostos pelo semeador da gentileza, mergulhando nas benesses do milagroso crescimento e na paz sem voz das fardas e esquadrões.

Gentileza se transformou em personagem pitoresco, mais um entre tantos, cuja figura excêntrica fez mais sucesso que a força de suas palavras. Quando morreu em 96, antes ainda tentou convencer líderes mundiais, que visitaram o Rio no Eco 92, da importância da gentileza para a paz mundial, o Rio já vivia a guerra patética das tropas e comandos e a ignorância individualista já era um pensamento corrente tanto na casa grande quanto na senzala. Pouco depois de sua morte, em nome do progresso, os muros onde estavam grafadas suas mensagens de amor e paz foram pintados. De cinza.

Hoje, nos tempos cinzentos de individualismo e isolamento, de pânico e barbárie, em que pensar em um sistema diferente do capitalismo corporativista é uma heresia digna de fogueira, a imagem de um dos homens mais ajuizados que esteve entre nós é tida como a figura de um louco. É uma pena que o Brasil não tenha enlouquecido com ele. Afinal, o mundo de Gentileza, um mundo de desapego aos bens materiais e ternura entre os homens, muito parecido com os idealizados por Cristo, Gandhi e Tolstoi (outros que são lembrados mais pela forma que pelo conteúdo), é muito mais lúcido que o mundo bárbaro para o qual os tecnocratas, publicitários e banqueiros nos empurraram.

Tomara, meu Deus tomara que em 2009, assim como o jardim plantado pelo profeta no terreno onde se deu a tragédia circense, a gentileza floresça e gere gentileza com a mesma intensidade com que proliferou o individualismo burro.

Enquanto isso não acontece, resta-nos acompanhar as atrocidades cotidianas nos obituários televisivos (“Todo dia você lê jornal, ouve rádio, televisão, só vê barbaridade: é crime, é assalto, é seqüestro, é vício, nudez, devassidão, fome e guerra.”) e ouvirmos, cheios de pavor, o lamento de Marisa Monte:

“...só ficou no muro tristeza e tinta fresca...”