segunda-feira, 23 de julho de 2007

DELÍRIO

Estrondo de avião. Explosão, fumaça e mortes. A imprensa quer culpados. O povo quer soluções. Chuva. Divulgação. Número de mortos. Apresentadores de TV ávidos por audiência. Corpos. Substantivos comuns. Arena Multiuso. Medalhas. Medalhas de bronze, de prata e de ouro. Ouro. Ouro para o bem do Brasil. Podium, lágrimas, bandeira hasteada e o Hino Nacional. O Hino.

Arnaldo Antunes grita: “Sou de lugar nenhum”.

Bandeira a meio-pau: luto. Mortos nas estadas. Falha Humana? Técnica? Problemas no asfalto? Falta de escape? Ônibus. Caminhões. Transportadoras. Resgate. Raios fúlgidos. Trilhos vazios. Sucatas. Oficinas de desmanche. Ônibus em chamas. Congestionamentos. Carros importados. Rios nunca navegados. Inavegáveis. Rios grandes. Rio organizado. Rio turbilhão. Portos ricos. Porto Alegre. Casais. Santos-Jundiaí. Terra da garoa. Levei um susto enorme nas asas da Panair. Alta dos combustíveis. Buraco. Metrô. Solução?

Rubem Braga escreveu: “Procura-se, e talvez não se queira achar”.

Atletas sem incentivo, mais medalhas. Atletas “Made in Brazil”, festa na torcida. O Cristo é nossa maravilha. Medalha de bronze. Berimbau metalizado. Mendigos. Farrapos. Bolsas. Transeuntes em pânico. Carros nas calçadas. Contramão. São São Paulo. Furtos. Falcões. Rapa. Rap. Rota. Sinais vermelhos. Mais medalhas. Amor e esperança. Trânsito caótico. Desrespeito. Exército. Bandeira. Cartões internacionais. Faixas de segurança. Balas perdidas. Delicadeza perdida.

Procura-se, e talvez não se queira achar...

Internet. Orkut, Blogs e Fotologs. Bate-papos sem papos. Fotos trágicas. Downloads. Bizarrices. Gerundismo. Estrangeirismos. Estréias. Filme americano. Manu Chao. Clandestinos. Desaparecidos. Panamérica. Bolívar. Gás. Gases. Al Gore. Multinacionais. Fumaça verde. Impressionismo. Presente Imperfeito. Paz no futuro. Aquele Abraço. Medalhas. Americanos. O uivo. A vaia. Florão da América. Concurso público. Um Brasil para todos. Saneamento Básico. Sem telas. Sem tetas. Sem terras.

Arnaldo: “Nenhuma pátria me pariu”.

Cristo Redentor. Negócios da China. Jogos de xadrez. Manchetes sensacionalistas. Orações subordinadas. Tropicanalhice. Mais um morto. Malvadeza. A Náusea. Lixo nas calçadas. Brasileiros-ianques. Cubanos-brasileiros. Bloqueio. Vôlei. Rio, eu gosto de você. Verbas. Impostos. Postos de gasolina. Hotéis de luxo. Aeroportos. Fome. Bandeiras. Entradas. Homens-peixes. Viadutos. Terminais. Arranha-Céu. Braços fortes. Peças presas. Ingressos caros. Quebra-quebra. Bispos. Xeques. Clava forte. Problemas solucionáveis, sem solução.

Procura-se, e talvez não se queira achar...

Inferno. Medalhas. Cristo. Carta. Capital. Provocações. Guanabara. Sorrisos. Falsos sorrisos. Pererê. Filhos ilegítimos. Bois. Argentina. Cambalache. Casa tomada. Prata. Ouro negro. Venezuela. Militares. Lábaro estrelado. Força aérea. Controladores. Descontrole. CPIs. Pedágios. Recessos. Outras mil. Platéia de costas. Classificados. Desclassificação. Ginástica. Ouro. Podium. Torres. Chamas. Medalhas. Crimes. Bancos. Propagandas. Cruzeiros. Lágrimas. Mate. Desordem. Derrida. Globalização. E o Hino.

Pau. Pedra. Caminho. Fim.

* Publicado também nos jornais Página Dois ( http://www.paginadois.com/conteudo.php?c=3669) e Direto da Redação ( http://www.diretodaredacao.com/ )

4 comentários:

Unknown disse...

Esse cara é grandioso! Com um pequeno empurrão se transformará num gênio da nossa literatura, provavelmente um José Agrippino de Paula, só que com muito mais consistência humana. Tenho acompanhado os artigos e os publicado com muito orgulho no humilde jornal para o qual trabalho!!! É isso aí, meu irmão!!! Segue forte que o mulekão só tem motivo de orgulho do pai!!!!

E vcs, leitores, sigam a recomendação "oficial" e comentem. Quem não elogia está furtando algo que não lhe pertence, recolhendo o benefício que os textos trazem para a alma e para o senso crítico e não deixando nada em troca para o operário das letras.

Abraços e parabéns, Leandrão!!!!

FL

Zilmara Dahn disse...

Nossa Leandro...seu texto parece aquele 1 minuto antes da morte..aquele filme delirante na cabeça, antes da luz ou das trevas.

Ganha um doce quem adivinhar o que virá por aí.
Se nos basearmos no presente, onde o Brasil surpreende com suas medalhas em esportes de pouco patrocínio e a estrutura inacreditavelmente tosca dos transportes aéreos tão metidos a besta..o que podemos esperar talvez seja um leve contra ataque. O povo tomou consciência de que sabe lutar (e de que pode ganhar). O povo agora quer andar de avião e provar caviar. E se continuar o desrespeito generalizado darão um Vasari na primeira autoridade desavisada que passar pela frente.
Até que os jogos do Pan serviram pra alguma coisa.

Se bem que prefiro golpes de capoeira.

Pena não ser conhecida como modalidade.

Anônimo disse...

fala muleki, cada vez mais prolífero, num tem jeito não, tu és um perigo literário, aguardo ansioso por seus escritos infecto-libertários (DESCONTRUÇÃO).parabéns, mantenha contatos e a caneta nas linhas....em tempo, e a prole??????

Anônimo disse...

Le

"mininu" dessa vez você se superou.Conseguiu atingir o nivel literário de expressão dentro de uma linguagem jornalística.

Parabéns !